EM MEIO A COISAS SIMPLES
De Luca Oliveira
Pablo acordou tenso. O relógio marcava 4:47am, e ele tentou lembrar se conhecia a mulher que estava ao seu lado.
Sua cabeça doía. Sentia ainda a mistura do gosto da nicotina, dos drinks e do batom daquela desconhecida. Mas, dessa vez, não se orgulhou disso. Levantou-se, ascendeu um cigarro e foi até o banheiro. Ao olhar-se no espelho, viu as marcas das chupadas no pescoço, e sentiu as costas arderem sob as marcas de arranhões feitos pelas unhas daquela mulher. Olhou então para a aliança na mão esquerda, e uma dor espantosa o invadiu. Uma mistura de tristeza, raiva e nojo de si mesmo, ao lembrar de sua esposa e sua filha de quatro anos, que naquele momento, deveria estar dormindo sem o pai em casa.
Saiu cambaleando, sob o efeito do uisk. Pegou suas roupas caríssimas do chão e saiu daquele apartamento sentindo-se o mais nojento e mau caráter dos homens.
Era uma manhã de sábado, e ele se encontrava como em todos os fins de sexta-feira que viveu conforme a imagem de “bem sucedido” lhe mostrava.
Parou seu carro na Rua Augusta e subiu até a Avenida Paulista procurando uma cafeteria. Imaginou que os efeitos da cafeína poderiam diminuir sua ressaca.
Ascendeu outro cigarro e olhou ao redor. Pensou em quantos homens “de bem”, assim como ele, passavam por ali. Viu um dos bancos que fora gerente, lembrou da fortuna que ganhou ali, e do número não menos alarmante de dinheiro que gastou em prostíbulos, bares e festas que só trouxeram como recompensa, a vergonha de estar traindo a mulher que jurara amar e ser fiel até a morte.
Lembrou de sua filha, seu rostinho e sua voz a pedir na noite anterior: “Papai, fica comigo hoje?”. Lembrou-se também de sua reação agressiva ao dizer “Tenho muito trabalho hoje, meu anjo... vou a uma reunião, e não posso perder tempo”. Lembrou de sua mulher a olhá-lo como quem sabe o que ele andava fazendo. Como quem estava cansada daquelas mentiras e desculpas cínicas. Pôde ver a expressão triste da garotinha que não desejava nada mais que a companhia de seu pai.
Pôs-se a chorar. Trêmulo, envergonhado. Daria todo seu dinheiro, carreira, nome e status que conquistou durante anos, por um momento sem aquela angustia.
No meio da multidão. Na região mais influente do estado mais populoso do país, um homem podre de rico, e de influência, curtia a vergonha de ser na verdade, um fraco miserável, pobre e mentiroso. Nunca se sentira assim. Sem que ele percebesse, estava buscando em coisas passageiras, uma paz permanente. Uma paz que ele desconhecia. Via no rosto dos executivos que passavam por ali, o semblante infeliz, o olhar insatisfeito de quem conseguiu tudo que se pode esperar: Um emprego perfeito, uma conta bancária perfeita. O carro perfeito... Só não, a sensação de estar livre para sorrir.
Com todo aquele glamour, todo aquele poder, ele se sentia pobre, fraco e impotente.
Passou sua vida buscando algo que nem toda sua herança, seu diploma, fortuna e império, poderiam lhe dar. Acreditava ser feliz assim. Ou melhor, fingia ser feliz assim. Mas, estava cansado de viver de fachada.
Seu relógio marcava agora, 5:23, e o cinza que cobria o céu naquele dia frio, foi aos poucos dando lugar ao vermelho-laranja do sol.
A cidade começava a acordar. Alguns estabelecimentos começavam a abrir. Ele só observava. Ainda chorando, na frente da cafeteria que esperava abrir, começou a perceber coisas que o cercaram durante muitos anos, mas ele não conhecia.
Viu no canteiro daquela avenida, flores plantadas. Teve o vislumbre das cores e da delicadeza delas. Uma mulher passou por ele com uma criança nos braços. E essa criança sorriu pra ele. Pôde perceber a vida pulsar em coisas simples que outrora, lhe eram insignificantes. Viu o Sol nascer. Sentiu sua luz e o bem estar causado pelo seu calor...
Sentiu então, pela primeira vez, uma sensação de alegria que nem seu dinheiro e as grifes que usava poderiam lhe proporcionar. E sim, coisas sem importância como uma a luz do sol, o sorriso de um bebê e uma flor que nasce no canteiro de uma avenida movimentada.
Viu que tudo o que tinha conquistado ao longo de sua vida, não lhe trouxe a paz que aquelas coisas “pequenas” lhe concebiam sem que ele pedisse ou se esforçasse para ver.
Nem os negócios milionários, suas viagens para o exterior e as prostitutas. Nada. Foi então para casa. Tomou um banho, uma aspirina. Foi até o quarto da filha, deu-lhe um beijo, a olhou por alguns instantes e saiu. Deitou-se ao lado de sua esposa que estava acordando, e que colocou o braço em volta de seu corpo, chegou seu rosto perto do dele e disse: “Eu te amo”.
Ele, com uma lágrima a escorrer, disse: “Querida, perdoe-me. Por favor”. Ela sorriu. Podia sentir que ele estava sendo sincero, e repetiu as palavras que há muito tempo, não ouvia dele.
Ele dessa vez chorou de alegria, pois percebeu que mesmo, se não tivesse as paredes e pisos cobertos de bens, tinha tudo que precisava para ser feliz.
De Luca Oliveira
Pablo acordou tenso. O relógio marcava 4:47am, e ele tentou lembrar se conhecia a mulher que estava ao seu lado.
Sua cabeça doía. Sentia ainda a mistura do gosto da nicotina, dos drinks e do batom daquela desconhecida. Mas, dessa vez, não se orgulhou disso. Levantou-se, ascendeu um cigarro e foi até o banheiro. Ao olhar-se no espelho, viu as marcas das chupadas no pescoço, e sentiu as costas arderem sob as marcas de arranhões feitos pelas unhas daquela mulher. Olhou então para a aliança na mão esquerda, e uma dor espantosa o invadiu. Uma mistura de tristeza, raiva e nojo de si mesmo, ao lembrar de sua esposa e sua filha de quatro anos, que naquele momento, deveria estar dormindo sem o pai em casa.
Saiu cambaleando, sob o efeito do uisk. Pegou suas roupas caríssimas do chão e saiu daquele apartamento sentindo-se o mais nojento e mau caráter dos homens.
Era uma manhã de sábado, e ele se encontrava como em todos os fins de sexta-feira que viveu conforme a imagem de “bem sucedido” lhe mostrava.
Parou seu carro na Rua Augusta e subiu até a Avenida Paulista procurando uma cafeteria. Imaginou que os efeitos da cafeína poderiam diminuir sua ressaca.
Ascendeu outro cigarro e olhou ao redor. Pensou em quantos homens “de bem”, assim como ele, passavam por ali. Viu um dos bancos que fora gerente, lembrou da fortuna que ganhou ali, e do número não menos alarmante de dinheiro que gastou em prostíbulos, bares e festas que só trouxeram como recompensa, a vergonha de estar traindo a mulher que jurara amar e ser fiel até a morte.
Lembrou de sua filha, seu rostinho e sua voz a pedir na noite anterior: “Papai, fica comigo hoje?”. Lembrou-se também de sua reação agressiva ao dizer “Tenho muito trabalho hoje, meu anjo... vou a uma reunião, e não posso perder tempo”. Lembrou de sua mulher a olhá-lo como quem sabe o que ele andava fazendo. Como quem estava cansada daquelas mentiras e desculpas cínicas. Pôde ver a expressão triste da garotinha que não desejava nada mais que a companhia de seu pai.
Pôs-se a chorar. Trêmulo, envergonhado. Daria todo seu dinheiro, carreira, nome e status que conquistou durante anos, por um momento sem aquela angustia.
No meio da multidão. Na região mais influente do estado mais populoso do país, um homem podre de rico, e de influência, curtia a vergonha de ser na verdade, um fraco miserável, pobre e mentiroso. Nunca se sentira assim. Sem que ele percebesse, estava buscando em coisas passageiras, uma paz permanente. Uma paz que ele desconhecia. Via no rosto dos executivos que passavam por ali, o semblante infeliz, o olhar insatisfeito de quem conseguiu tudo que se pode esperar: Um emprego perfeito, uma conta bancária perfeita. O carro perfeito... Só não, a sensação de estar livre para sorrir.
Com todo aquele glamour, todo aquele poder, ele se sentia pobre, fraco e impotente.
Passou sua vida buscando algo que nem toda sua herança, seu diploma, fortuna e império, poderiam lhe dar. Acreditava ser feliz assim. Ou melhor, fingia ser feliz assim. Mas, estava cansado de viver de fachada.
Seu relógio marcava agora, 5:23, e o cinza que cobria o céu naquele dia frio, foi aos poucos dando lugar ao vermelho-laranja do sol.
A cidade começava a acordar. Alguns estabelecimentos começavam a abrir. Ele só observava. Ainda chorando, na frente da cafeteria que esperava abrir, começou a perceber coisas que o cercaram durante muitos anos, mas ele não conhecia.
Viu no canteiro daquela avenida, flores plantadas. Teve o vislumbre das cores e da delicadeza delas. Uma mulher passou por ele com uma criança nos braços. E essa criança sorriu pra ele. Pôde perceber a vida pulsar em coisas simples que outrora, lhe eram insignificantes. Viu o Sol nascer. Sentiu sua luz e o bem estar causado pelo seu calor...
Sentiu então, pela primeira vez, uma sensação de alegria que nem seu dinheiro e as grifes que usava poderiam lhe proporcionar. E sim, coisas sem importância como uma a luz do sol, o sorriso de um bebê e uma flor que nasce no canteiro de uma avenida movimentada.
Viu que tudo o que tinha conquistado ao longo de sua vida, não lhe trouxe a paz que aquelas coisas “pequenas” lhe concebiam sem que ele pedisse ou se esforçasse para ver.
Nem os negócios milionários, suas viagens para o exterior e as prostitutas. Nada. Foi então para casa. Tomou um banho, uma aspirina. Foi até o quarto da filha, deu-lhe um beijo, a olhou por alguns instantes e saiu. Deitou-se ao lado de sua esposa que estava acordando, e que colocou o braço em volta de seu corpo, chegou seu rosto perto do dele e disse: “Eu te amo”.
Ele, com uma lágrima a escorrer, disse: “Querida, perdoe-me. Por favor”. Ela sorriu. Podia sentir que ele estava sendo sincero, e repetiu as palavras que há muito tempo, não ouvia dele.
Ele dessa vez chorou de alegria, pois percebeu que mesmo, se não tivesse as paredes e pisos cobertos de bens, tinha tudo que precisava para ser feliz.
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